[Artigo] A importância da rede de colaboração em prol da conservação dos manguezais no litoral norte do Paraná

Como organizações, comunidades e governo vêm integrando ações de monitoramento, pesquisa científica e restauração de manguezais, que impulsionam políticas públicas e a prática da economia restaurativa no litoral norte do Paraná/Foto: Rodrigo Condé

Por Rodrigo Condé*

O Brasil é o país mais biodiverso do mundo. Estima-se que entre 10 a 20% de toda a biodiversidade global esteja concentrada em nosso país. São cerca de 116 mil espécies animais e mais de 46 mil espécies vegetais, segundo o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.

Elas estão distribuídas nos seis biomas terrestres e também nos três ecossistemas marinhos presentes no território. Toda essa biodiversidade é explicada não somente pela grande dimensão territorial de nosso país, mas também pela diversidade de ambientes que a geografia do país proporciona, com grande variação geomorfológica, de altitude e latitude.

Uma porção dessa biodiversidade está legalmente protegida nas Unidades de Conservação (UCs) do país. As UCs no Brasil são divididas em duas categorias: as de Uso Sustentável e as de Proteção Integral, cada uma com seus regimentos e objetivos distintos. Elas são responsáveis por garantir uma série de provisão de serviços ecossistêmicos, como água limpa, controle do regime de chuvas, recursos pesqueiros, alimentos saudáveis, fertilidade dos solos e muitos outros benefícios que dinheiro nenhum pode comprar e que o ser humano é incapaz de reproduzir.

A Grande Reserva Mata Atlântica é um território localizado entre o sul de São Paulo e Norte de Santa Catarina, tendo seu coração localizado no litoral do Paraná. Este maciço compreende cerca de 2.7 milhões de áreas terrestres e cerca de 2,1 milhões de hectares de área marinha. Também reúne o maior e mais bem conservado remanescente de Mata Atlântica ainda restante.  O recorte territorial abriga 110 unidades de conservação, sendo 58 de uso sustentável (2,1 milhões de hectares) e 52 de proteção integral (665 mil hectares).

Esse mosaico de Unidades de Conservação abriga importante parcela da biodiversidade desta porção do Bioma, que é um dos mais ameaçados do mundo, com cerca de 7% da sua área ainda em bom estado de conservação. Este território possui uma ampla diversidade cultural e histórica com uma gastronomia muito rica, sendo considerado um destino de turismo promissor e em ascensão no país.

Grande parte do território está sob gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). O órgão é responsável pelo Programa Nacional de Monitoramento da Biodiversidade, conhecido como “Monitora ICMBio”, que promove o levantamento e monitoramento da biodiversidade no país. No litoral Norte do Paraná, o Núcleo de Gestão Integrada responsável é o NGI-Antonina-Guaraqueçaba que, sob a liderança da veterinária Camile Lugarini, faz a gestão da  Área de Proteção Ambiental de Guaraqueçaba (247.747,96 ha) Estação Ecológica de Guaraqueçaba (4.370,15 ha), Parque Nacional do Superagui (33.988,00 ha) e Reserva Biológica Bom Jesus (34.179,74 ha). 

A SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental) é uma das organizações do terceiro setor pioneiras na conservação de áreas protegidas privadas no Brasil, que são as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs). A história da veterana instituição no litoral do Paraná tem um marco importante no começo dos anos 2000, quando adquiriu antigas fazendas de búfalo nos municípios de Antonina e Guaraqueçaba a partir de recursos providos pela The Nature Conservancy (TNC) em um projeto de combate às mudanças climáticas.

As áreas somam mais de 19 mil hectares em diferentes estágios de conservação, incluindo quase 2 mil hectares de pastagens que, após 20 anos, seguem em processo de restauração ecológica, em um dos programas mais longevos em atividade no país. A boa gestão dessas áreas gera aos municípios de Antonina e Guaraqueçaba quase 10 milhões de reais anualmente por meio de repasse de ICMS-Ecológico. 

A SPVS sempre foi casa de inúmeros pesquisadores com ampla geração de estudos em suas Reservas Naturais sobre diferentes assuntos. Entre as pesquisas realizadas no território, merece destaque o monitoramento de manguezais, que é realizado pela Mar Brasil e pelo Laboratório de Ecologia e Conservação da UNESPAR Campus Paranaguá (Labec/UNESPAR), com apoio do ICMBio. As informações extraídas desta pesquisa abastecem o banco de dados do “Monitora ICMBio” e contribuem para a ampliação do conhecimento sobre os manguezais do sul do Brasil.  

O Programa Monitora ICMBio busca gerar informações qualificadas para avaliar a efetividade das UCs federais na conservação da biodiversidade. Também acompanha alterações na distribuição de espécies diante de mudanças climáticas e outras ameaças, como as espécies exóticas invasoras. O programa subsidia o planejamento do manejo da fauna, flora e a conservação de espécies ameaçadas. 

Em apoio a essa iniciativa, o projeto “Entre Mangues e Caranguejos” executado pela SPVS, com o apoio financeiro do programa “Floresta Viva” por meio do Edital Manguezais do Brasil, que é gerido pelo FUNBIO (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade), com recursos destinados pela Petrobras e pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), vai permitir a inclusão de pelo menos mais três pontos de monitoramento nos municípios de Antonina e Guaraqueçaba.

Além disso, o projeto promove diálogo com as comunidades de entorno e também está dando sequência em ações de restauração de 316 ha de antigas pastagens em áreas de contribuição aos manguezais da Estação Ecológica de Guaraqueçaba, que possui áreas contíguas a Reserva Natural Papagaio-de-Cara-Roxa, que foi criada pela instituição para auxiliar na conservação do raro papagaio encontrado em uma pequena porção do litoral norte paranaense e sul paulista.

O monitoramento de manguezais é uma poderosa ferramenta para auxiliar na tomada de decisões e geração de políticas públicas relacionadas à conservação deste importante ecossistema que armazena grande quantidade de carbono, garante boa parte do estoque pesqueiro regional e protege as comunidades das mazelas das mudanças climáticas. 

O monitoramento faz parte de um conjunto de ações que visam a efetiva implementação das unidades de conservação no território, conforme os preceitos do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC. O correto manejo, fiscalização, pesquisas científicas e uso público podem gerar emprego e renda que são possibilitados quando as unidades de conservação estão atuantes e fortalecidas no território além de gerar arrecadação para os municípios por meio do ICMS-Ecológico, que pode ser revertido em ações de melhoria de qualidade de vida para a população, atendendo a demandas históricas das comunidades.

A união de esforços, a implementação das unidades de conservação e a ampliação do diálogo no território são pontos fundamentais para fomentar o desenvolvimento de uma das regiões com grande potencial de promover uma economia restaurativa e comprovar que “produção de natureza” pode ser um bom negócio para todos que habitam estas belíssimas paisagens esculpidas no litoral norte do Paraná.

*Engenheiro Florestal pela UFRRJ e Mestre pela UFPR. É especialista no uso de espécies nativas em sistemas agroflorestais e restauração florestal e trabalha para a SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental).

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